sexta-feira, 24 de junho de 2011

Um conto de amor


            Marcus era seu nome. Trabalhava numa firma de limpeza e conservação de telefones públicos. Trabalhava duro, mas não reclamava. Já havia ficado desempregado e, só Deus sabia o quanto, sofrera. Preferia chegar em casa suado e cansado, do que passar noites em claro preocupado com seu próprio sustento.
            Gostava muito quando era escalado para trabalhar no calçadão da praia. Ficava olhando para o horizonte, pensando em seu destino. O que estaria reservado para ele? Foi numa manhã de Sol, justamente em seu lugar favorito, que a resposta lhe foi dada.
            Marcus lustrava um orelhão quando, de repente, o telefone tocou. Deixou tocar, mas algo lhe dizia para atender. Do outro lado da linha, uma voz doce começou a falar. O sotaque era diferente e encantador. Sentiu uma paz, uma tranqüilidade que não conhecia e se sentiu inteiro, pleno, completo. Jussara, do outro lado da linha, sentiu a mesma coisa. Discou o número errado e acertou em cheio. Seu desejo havia se realizado. Desde então, Jussara e Marcus se falavam uma vez por mês. Falavam pouco, pois o dinheiro era curto. Mas esse era o único dia do mês que importava. Marcus colocava camisa limpa, Jussara passava perfume. Um mês era ele quem telefonava, no outro era ela. E sempre na hora marcada, Jussara ligava para aquele mesmo número do engano mais acertado de sua vida.             Marcus morava longe e tinha que pegar um ônibus e muita estrada para chegar ao cenário da sua história de amor. Não se importava. Isso fazia com que o encontro com Jussara durasse mais tempo, além dos poucos minutos de ligação. Quando desligava, Marcus sentava ao lado do telefone e ficava olhando o mar. O balanço das águas era como o andar de Jussara. Ele a via em cada detalhe daquela paisagem. Só teve uma coisa que Marcus não quis contar. Que aquele número era de um telefone público. Achou que se ela soubesse que qualquer um poderia ter atendido, talvez... bobagem, mas não quis contar.
            Um dia a hora marcada passou e o telefone não tocou. Marcus sentiu a dor de espera e cada minuto era um ponteiro cravado em seu coração. Telefonou desesperadamente, mas Jussara não atendia. E o verão inteiro passou. Certa vez saiu de madrugada, pois não conseguia mais dormir. Pegou o ônibus e foi até o telefone que trazia a voz de Jussara. Ligou sem se importar com a hora. O céu estrelado, a praia vazia, o coração gelado. Alô? Disse a voz sonolenta, já não tão doce. Ao ouvir Marcus, Jussara brigou, chorou e só parou quando entendeu que Marcus não conhecia a mulher que atendeu o telefone público numa noite em que Jussara ligou, ansiosa, para lhe dizer que havia conseguido juntar um dinheiro para viajar ao seu encontro. Marcus se derreteu de amor e entre lágrimas marcaram, enfim, o primeiro e tão sonhado encontro. Dezoito anos depois que o telefone tocou, naquela manhã de Sol.

(escrito em 2006)

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