domingo, 20 de janeiro de 2013

Como me transformei em uma Super Chef



              Tudo começou quando eu era pequena e presenciei a chegada do microondas lá em casa. Na verdade, tudo terminou ali mesmo. Toda e qualquer habilidade para cozinhar se resumiu aos botões ligar e cancelar. 
            Até para esquentar água para o chá, eu usava o microondas. Já sabia os minutos exatos para a temperatura certa, sem ter que ficar assoprando a xícara com medo de queimar a língua. Se eu não fui capaz de fazer amizade com a chaleira, imaginem o que as panelas deveriam pensar de mim! E, por conta disso, passamos anos nos ignorando.
            Depois que vim morar sozinha no Rio, copiei algumas receitas da minha mãe. Aliás, cabe mencionar aqui, que o livro de receitas da minha mãe tem um quê de livro mágico. Deveria se chamar “O Fantástico Livro de Receitas Maravilhosas da Minha Mãe”! Ali dentro se concentram combinações perfeitas de ingredientes e temperos que resultam nas mais deliciosas refeições! É como se fossem poções mágicas, cheias de segredos! Sim, porque comida de mãe é o que há de mais gostoso nesse mundo. E vá explicar! O fato é que, munida com as super receitas, fui me aventurar na cozinha. Abri meu singelo caderninho onde copiei quatro ou cinco receitas simples (porque eu não sou abusada) e comecei a seguir cada orientação. O que me faltou naquela época foi o Google! Será que alguém poderia me explicar o que significa refogar? Eu refogo, tu refogas, ele refoga! Que verbo era esse? Fechei o caderninho, que até hoje não ganhou nenhuma receitinha nova, e encerrei minhas atividades culinárias.
            Minha história com a cozinha poderia ter terminado aí, no parágrafo acima. Mas como tudo é possível e imprevisível nessa vida, eis que o destino preparou uma surpresinha para mim. Recebo um telefonema da produção do programa Mais Você, da Globo, me convidando para um reality de culinária, só com famosos. Achei a idéia ótima e, para quem já participou do Rally dos Famosos, do Maratoma do Faustão, De Cara no Muro, Sufoco e outras competições malucas, cozinhar não me pareceu tão arriscado assim. Só depois que desliguei o telefone, fui me atentar a um pequeno detalhe: eu nunca tinha feito sequer arroz na minha vida!!! Passada a crise de riso nervoso, combinei com as amigas uma operação de guerra em busca do alho perdido! Minha rotina diária passou a ser: acordar, ir ao mercado, comprar os ingredientes e acampar cada dia na cozinha de uma amiga. Cheguei a comprar potinhos especiais para carregar ovos. Onde eu vou usar isso depois eu não sei, a não ser que eu os leve para passear antes do omelete!
            Além das minhas amigas e da minha mãe, que acompanhou tudo pelo telefone e mandou por e mail várias de suas formidáveis receitas, também tive a ajuda do meu diaristo (sim, no masculino). Ele me ensinou a fazer strogonoff e só então fui descobrir que vai conhaque na receita! Juro que eu não sabia, tamanho o meu interesse pelo assunto. Foi realmente um supletivo gastronômico onde, em uma semana, os meus dedicados instrutores me ensinaram a refogar, untar, saltear, flambar e tantos outros verbos que não faziam parte do meu vocabulário.
            As gravações começaram e eu tive a chance de aprender muita coisa interessante com grandes Chefs de verdade! Mas, principalmente, aprendi uma receita saborosa, onde experimentei o gosto de me reinventar e a certeza de que nunca é tarde para aprender. A arte culinária que, praticada por mim, não prometia passar de um angu com caroço, se revelou uma verdadeira sopa no mel! Me apaixonei pelos temperos e fui, enfim, apresentada às panelas e à toda turma de utensílios. Comprei um livro de receitas novinho onde guardarei meus próprios segredos. Tudo isso me fez olhar para a minha cozinha de outra forma e, desde então, temos dividido bons momentos juntas.  
            Foi assim, misturando ousadia e superação, com algumas pitadas de curiosidade e diversão à gosto, que fui parar no Super Chef Celebridades! 


(escrito em setembro de 2012)

Os estragos de uma festa americana

               Com tantos sites de relacionamento, namoros e amizades virtuais, eu me pergunto: será que ainda existe “festinha americana”? Quem viveu esta época, por favor, se acomode aí na cadeira e desfrute comigo deste flash back.
             Quando eu tinha meus onze, doze anos era comum alguém da turma dar uma festa na garagem de casa. Sem dúvida era o evento social preferido de oito entre dez adolescentes. A característica da festinha era cada um levar algo para o lanche. Normalmente os meninos levavam refri e as meninas salgadinho. Um aparelho de som era imprescindível, assim como muitas fitas K7, recheadas com as músicas lentas mais tocadas na rádio. Pronto, estes eram os ingredientes. Ah, e uma turma de meninos e meninas arrumadinhos e cheirosinhos. Era muito legal ver aquela galera que brincava de esconde-esconde, jogava caçador ou andava de Caloi Cross, chegar com gel no cabelo e uma roupa bem passada. Havia um certo constrangimento no início, pois os meninos tinham que tirar as meninas para dançar. O receio deles era ela recusar. O receio delas era não ser tirada. Era o famoso e temido “chá de cadeira”. Mas uma sábia criatura inventou a “dança da vassoura”, onde a gente tinha a chance de dançar com os meninos mais bonitos, mesmo que eles não nos convidassem. 
               Parece tudo tão perfeito. Mas após esta rápida explicação não posso evitar as lembranças que me vêm à mente. Como fez falta, naquela época, um blog sobre defesa e sobrevivência nas festinhas americanas. Eu que o diga. Fui campeã de micos e trapalhadas. Mas teve uma festa em especial que bati todos os recordes. Eu, que só usava rabo de cavalo no colégio, resolvi ir de cabelo solto com a intenção de arrasar na festa. Mal sabia eu a bomba relógio que eu levava na cabeça. Quando cheguei lá, o salão de festas do prédio estava escuro com a música no último volume e luzes coloridas girando. Foi a primeira vez que vi um strobo (aquela luz que pisca e dá a sensação de estarmos em câmera lenta). Me deu uma vertigem e fiquei parada no meio da pista, ainda vazia, com as mãos esticadas para frente, como quem está tendo uma crise de labirintite tentando desesperadamente se equilibrar. Cambaleando fui até a parede mais próxima, onde me encostei e ali fiquei até acostumar a vista. Para a minha decepção não tocava música lenta como de costume. Eu detestei, pois queria dançar com o menino que eu gostava, coisa que só aconteceria graças à vassoura. Eu quase levei a minha de casa logo para me garantir. Mas nesta festa nem vassoura tinha e dançar aquelas músicas agitadas estava fora de cogitação. Infelizmente não tinha youtube naquela época, pra gente assistir mil vezes o clipe até aprender os passos. Resolvi me aproximar da rodinha onde o menino estava conversando. Todos munidos com seus copos descartáveis de refrigerante e eu sem. Foi ali que descobri a utilidade de um copo quando a gente não sabe o que fazer com as mãos. Se ao menos nessa época tivesse um celular pra gente ficar mexendo. Tentando ser legal dei risada de tudo que parecia ser engraçado. Confesso que não estava prestando atenção, devido ao nervosismo. Foi aí que o pior aconteceu. Numa performance mais elaborada, me virei gargalhando de olhos fechados e dei com a cara em um extintor de incêndio. Imediatamente eu virei o motivo da risada geral e assim que eu recobrei os sentidos, saí de fininho. Tão de fininho que uma menina trombou comigo e me deu um banho de coca-cola.
             Quando minha mãe foi me buscar, passei por um espelho da portaria e só então vi a situação do meu cabelo. Eu parecia o Capitão Caverna depois do susto. Hoje dou graças ao meu bom Deus por não existir facebook ou Instagram naquela época.


(escrito em  julho de 2012)

O quarto elemento



                Estou com medo da minha inquilina. Ela se mudou pra cá de mala e cuia, na surdina e já está se achando a dona do campinho. Não sei se aquilo é vespa ou se é o avatar de uma vespa. Só sei que voa. E deve picar. Sim, porque ela carrega a tiracolo uma bolsa enorme de veneno. Não que eu seja impressionada, mas tem grandes chances de ser letal.
            Inventei de tirar uma foto dela e fiquei assustada como é encorpada. É quase um cachorro de tão grande! Ao ampliar a foto vi que, como se não bastasse, a esnobe é toda trabalhada no preto com pintas amarelas. Que mané abelha?! Estamos falando de um inseto raro, que não se vê por aí pousando em qualquer latinha de refrigerante. Cheguei a chamá-la de Coco Chanel, pela elegância e pela bolsa (aquela do veneno), mas o medo ficou tamanho que eu não quero saber de intimidades. É o quarto elemento e pronto, já que até agora só morávamos nesta casa: meu marido, minha cachorrinha e eu. Após eu ter descoberto e destruído sua primeira casinha na árvore da sacada, a abusada escolheu um vaso aqui dentro da sala pra construir sua nova toca do Gugu. E não pensem que a casinha dela é comunitária, daquelas que abrigam várias vespas. Não! A dela é só dela. Mas quem ela pensa que é, um João de Barro?
               Cada vez que ela levanta vôo eu corro lá pra dentro derrubando tudo com medo de um ataque, mas estou percebendo que ela não está nem aí pra mim. Muito disciplinada, está focada no trabalho, entra e sai do apartamento com objetivo definido. Não é como aquelas moscas alucinadas que se trombam no vidro e mudam de direção bruscamente. Esta é calculista e tem o domínio completo de suas atitudes. Perfil semelhante aos dos psicopatas, o que me arrepia. Decola e faz a curva com precisão, sem esbarrar em nenhum vidro e vai certeira em busca do material necessário para sua construção. Não me perguntem o que é e nem onde ela vai buscar. Mas volta com outra bolsa carregada de "cimento" e, com uma habilidade incrível, espalha pelo galho no lugar escolhido, camada sobre camada, até a coisa ir tomando a forma de uma caverninha. Agora ela saiu pela sacada e eu decidi agir. Cheguei a pensar em pegar o laquê de cabelo, porque é ótimo para mosquito. Eles endurecem e perdem a mobilidade. Mas achei que para um bicho deste tamanho eu tinha que partir para substâncias mais tóxicas. Corri para o armário de produtos de limpeza e escolhi o que eu acho mais nocivo: cif desengordurante. Adoro! Com toda a crueldade que encontrei dentro de mim, fui até seu projeto de casulo e espirrei cif com gosto. Formou até uma piscininha. Ela ainda não voltou. Não sei se fico pra ver o trágico momento em que ela lamber sua massinha e sentir o cif queimando suas entranhas como quem bebe cicuta. Depois disso terei o cadáver dela caído na minha estante. Coisa que talvez me impressione um pouco. A cabeça dela é tão grande que, provavelmente, estará com alguma expressão macabra do tipo: "Eu voltarei". Falando nisso ela ainda não voltou. Será que foi buscar reforço? Eu não posso me intimidar, eu sou maior do que ela. E eu estudei! Se ela não voltar não haverá mais crime, certo? Então nada de pesadelos com a morta e nem vinganças do além. Mas por que será que ela não voltou? Será que ela vem pelo faro e o cheiro do cif a confundiu? Tipo quando dá pau no GPS?!  
              Ou ela tem mais o que fazer e foi cuidar da vida, me deixando aqui, totalmente desfocada dos meus compromissos, investigando o comportamento de uma espécie antipática de vespa. É impressionante a capacidade que a gente tem de se distrair com bobagens. Ai, ai. Lá se foi meu dia.


(escrito em junho de 2012)