segunda-feira, 27 de junho de 2011

Se alguém dança, eu danço


               Vida de artista não é nada fácil. E artista que não é famoso, então, nem se fala. Eu sei disso muito bem, já que 90% dos meus 20 anos de carreira foram no anonimato. Mas faz parte e devido a tantos perrengues, a gente passa a valorizar muito mais cada conquista.
              O problema é que para cada conquista, temos que passar por inúmeros testes. E o mais desafiador é o teste de nervos! Sim, porque não é fácil manter a calma com tanta expectativa. Sem falar das enrascadas e dos micos que a gente paga. Certa vez fui fazer um teste de dança para um comercial do Burger King. Grana boa! Fui no caminho me lembrando de um teste que eu tinha feito, no qual me sai muito bem. Também era de dança e só tinha bailarina de verdade. Todas esparramadas pelo chão se contorcendo. Definitivamente elas não têm ossos! Sem hesitar, eu e toda minha flexibilidade começamos a improvisar uma coisa qualquer parecida com "estou me aquecendo". O professor passou uma coreografia ensandecida de street dance e eu, bravamente, acompanhei do começo ao fim. Passei em todas as etapas e fui convidada para viajar com a companhia de dança da coreógrafa. Claro que eu não fui, mas gostei da experiência. Então, lembrei disso e pensei: "Este teste está no papo. Sempre passo em testes de dança". Já estava até pensando no que fazer com o dinheiro.   É minha gente, mas confiança não é tudo nesta vida. Quando eu cheguei lá pediram que eu me dirigisse ao mezanino onde a professora estava passando a coreografia. Depois era para descer na maquiagem e gravar individualmente no estúdio. Me lembro de cada detalhe como se fosse ontem, tamanho o trauma. Foi uma cena hilária! A professora, de salto alto, não mostrava os passos. Ela simplesmente, dizia algo tipo assim: “Conta sete, chassê, contra-tempo, pliê, posiciona pirueta dupla, cinco e seis e sete e oito. Cupê, grand-jetê, contra-tempo, gira, abre, três e quatro, socorro, padeburrê, pliê, seiláoquê!” Deus do céu! E o pior é que todas as bailarinas faziam exatamente o que ela estava pedindo. Imaginem a minha situação no meio do grupo. Comecei a copiar as meninas. Em quatro ou cinco repetições elas estavam prontas e desceram pra maquiagem. Então pedi para a professora para continuar com o próximo grupo. Meio a contra-gosto ela deixou. A cena se repetiu. Ela falou aquelas palavrinhas mágicas e as libélulas-saltitantes começaram a dançar todas juntas. E a vespa-alucinada aqui, feito louca correndo atrás do prejuízo. Quando acabou esse grupo, eu fiquei lá pronta para encarar o próximo. Foi quando a professora agradavelmente me expulsou. Então fiquei no corredor tentando pegar os passos que me faltavam daquele quebra-cabeça maluco que alguém resolveu chamar de coreografia. Chegou a minha vez. Entrei no estúdio e... cleck! Minha coluna travou. Fiquei lá congelada. Parecia brincadeira. O produtor soltou a música e nada aconteceu. Somente um suspiro de dor que mais parecia o som de um bezerro afônico. Os olhares se cruzaram e a dúvida que pairava no recinto era: “Quem é a doida?”. Fui embora mancando com a sensação de ter rasgado dinheiro. Resultado: dancei! Dancei muito, mas no pior sentido da palavra.     

(escrito em fevereiro de 2011)

Nenhum comentário:

Postar um comentário