domingo, 26 de junho de 2011

Amigo é coisa pra se guardar


Aí está um defeito que eu tenho. Eu gosto de guardar tudo. Principalmente coisas que me tragam alguma lembrança boa. Guardo as cartinhas que troquei com as amigas na época de colégio, os meus diários, os cadernos de recordações, agendas, fotos, bilhetinhos... Mesmo porquê, as minhas amigas são as mesmas até hoje. Pois é, dentre outras coisas, costumo conservar muito bem minhas amizades.
Foi em uma viagem de férias com a família, que conheci um grande amigo. Estávamos seguindo pela única estrada que levava ao sítio da minha irmã, em Paraty, quando nos deparamos com uma árvore caída, impedindo nossa passagem. Descemos do carro para estudar um jeito de tirar o tal obstáculo, quando vi um ninho no meio dos galhos. Lá estavam três periquitinhos e um ovo. Eram recém-nascidos, magrinhos, sem penas... Fui criada em apartamento, nunca imaginei ver uma cena como aquela. Fiquei tão encantada que... guardei. Sim, com carinho os levei comigo.
Alimentei-os com Danoninho e acompanhei o crescimento dos três. O maior e o menor deles, nos deixaram. O primeiro ficou lindo e forte. Quando percebeu um bando da sua espécie sobrevoando o sítio, voou ao encontro deles e se foi. O menorzinho, muito fraquinho, não resistiu e morreu. Ainda tenho dúvidas se foi fuga e suicídio, mas o fato é que o do meio ficou comigo. Meu grande amigo Yuki.
            Ele deixou para trás a verde mata de Paraty, a imensidão do céu e a liberdade da natureza, para viver comigo no meu apartamento em Curitiba. Yuki não sabia voar, portanto não havia a necessidade de deixá-lo preso. Andava atrás de mim pela casa e vinha correndo quando era chamado. Estudava comigo, montado na caneta enquanto eu escrevia. Segurava na minha roupa e saíamos juntos para passear. Sem falar os beijinhos que ele me dava. Está bem, eram bicadinhas carinhosas mas, o fato é que o Yuki era um amiguinho muito especial.
            Infelizmente, algo de muito trágico aconteceu. Eu estava fazendo um curso em São Paulo e o Yuki ficou em casa com a minha mãe. Ela adorava a companhia dele. Num rompante de aventura, meu periquitinho pulou da cama para o chão e quando minha mãe, distraída, se virou, chutou o pobrezinho. Desesperada, tentou “ressussitar” o bichinho, mas não teve jeito. Ainda sem saber o que fazer, minha mãe telefonou para a nossa diarista, a Ivanilda, que sem titubear deu a solução: “Ah, dona Marilena, põe no freezer.” Quando eu cheguei de viagem, recebi a notícia da morte do Yuki e chorando perguntei: “Onde ele está?” Tudo bem que eu sou criativa, mas confesso que isso jamais passou pela minha cabeça. Quase dei risada quando minha mãe me respondeu com a voz trêmula: “No freezer.” Depois de analisar o novo e frio habitat do meu amigo, acabei gostando da idéia de conservá-lo ali mesmo. E o deixei    guardadinho no freezer por 5 anos!
Nesse meio tempo, eu me mudei para o Rio de Janeiro e não podia levar o Yuki comigo. Pelo menos, não congelado. Então, tive a grande idéia de mandar empalhar! Ele está lindo e agora é parte da decoração da casa. No Natal usa um pequeno chapéu de Papai Noel e faz sucesso com as visitas.
Na prateleira ou no coração, amigo é mesmo coisa para se guardar.

(escrito em janeiro de 2011)

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