quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A Casa dos Papagaios


              Tem gente que faz de tudo para não encarar uma viagem de carro com a família. Mas eu sempre gostei. Antigamente íamos assim: mãe e pai na frente e as três filhas atrás. Eu, como era a menor, sentava sempre no meio, sem direito a negociações. Mas isso não durou muito. Logo minhas irmãs ficaram independentes, passaram a viajar sozinhas e eu reinei absoluta no banco de trás do carro.
            Morávamos em Curitiba e nosso principal destino era o litoral do Paraná, mais precisamente a praia de Caiobá, onde tínhamos apartamento. Dentro do carro, já a postos, cumpríamos nossas tradições como o “beijo de viagem” e a oração “Caminhos caminhamos”. Meu pai, engraçado que só, contava várias estórias e a gente morria de rir. Muitas vezes pedia para ele repetir alguma. Na Serra do Mar enxergávamos nitidamente um gigante deitado e o seu perfil desenhado pelas montanhas. Tinha também a “Ilha de Terra” que eu batizei quando criança. Não sossegava enquanto não a via. Sem falar do nosso repertório musical (sempre o mesmo) que fazíamos questão de cantar quase aos berros pela estrada.
             Certa vez, notamos no meio da mata, bem longe da beira da estrada, um enorme casarão. Não sei por que cargas d’água alguém falou que era a “Casa dos Papagaios”. Ninguém se lembra a origem do nome. O fato é que a tal casa virou ponto turístico das nossas viagens. Um de nós sempre anunciava: “Olha a Casa dos Papagaios”. Com o passar dos anos, notamos que uma grande construção surgiu ao lado do casarão e aí começou a especulação. Meu pai apostava ser um convento. Minha mãe já dizia ser um cassino. Cada um defendia seu palpite e eu me divertia com as suposições.
            Num dia de chuva, no meio das férias, veio a idéia. Estávamos todos em Caiobá, fechados no apartamento, sem nada para fazer, quando meu pai sugeriu: “E se a gente fosse até a Casa dos Papagaios?” Todos se olharam em silêncio. Meu pai continuou: “Fazer uma visita, ver o que tem lá?” Imediatamente todo mundo topou. Entramos no carro e fomos fazendo apostas. Ríamos ao imaginar o dono da casa, nos atendendo com nariz curvado, a voz nasalizada e repetindo seu nome: “Louro, Louro”. Queríamos encontrar uma justificativa para o misterioso nome da mansão. A ida já valeu, pois foi uma farra. Quando chegamos lá, descobrimos que se tratava de um mega hotel. Fizemos uma visita e conhecemos todas as instalações. Fomos muito bem recebidos e ficamos admirados com a beleza do lugar.
            No final das férias, de volta para casa, passamos pela estrada e vimos o casarão de longe. Olhamos pela janela do carro com aquela sensação meio frustrante de ter desvendado um mistério. De ter estragado a brincadeira. Até que um de nós falou com empolgação: “Olha a Casa dos Papagaios!” e todos vibraram. Sim, era assim que gostávamos de vê-la. Do nosso jeito. Com a nossa história. E era assim que ela continuaria sendo para cada um de nós. 

(escrito em julho de 2011)

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